Ita, Comida Caseira: um português em São Paulo
Sei que a Páscoa já passou faz tempo, mas preciso desabafar um trauma meu de infância:
Uma das maiores frustrações gastronômicas da minha vida sempre foi o bacalhau da Semana Santa que tinha mais batatas e cebolas do que Bacalhau. Resumindo: passando a Semana Santa no interior de Minas Gerais, para chegar no domingo e ser inundado por batatas cozidas e cebolas. Muitas cebolas! Muitas batatas!
Bacalhau nunca foi um peixe fácil de se achar, e nem um pouco barato. Se a tradição da Páscoa mandasse a gente comer lambari no domingo, estaríamos melhor servidos.
Porém, há um lugar nos cafundós da Cracolândia de São Paulo que serve esse peixe do melhor jeito possível, desde 1953. O Ita, lá na Rua do Boticário – próximo à Galeria do Rock.
Restaurante português, de dono portugueses, oferecendo o bacalhau mais gordo que você vai comer na sua vida. Um lugar simples mas aconchegante, botequim com azulejos lusitanos, que me traz memórias da infância.
– Uai, Angelo, você teve avós portugueses?
– Não, gente. Estou falando em sentar pra comer em São Paulo e não ser extorquido por preços exorbitantes.
Apesar de sempre ter vontade de abraçar o Seu Luis e a Dona Maria, que mesmo estando no Brasil há décadas não perderam uma vírgula do sotaque (e adoram contar as histórias de além-mar), eles não lembram em nada meus avós.
Há um oceano Atlântico, cheio de bacalhaus, separando minha árvore genealógica da terra de Camões. Mas a memória afetiva surge ao sentar em um lugar simples, com comida boa e a preços justos.
O prato principal da casa sai a R$ 24,00.
Bacalhau. Gostoso. Imenso. E barato. Amor eterno ao Seu Luis e à Dona Maria.
E se tem algo além desse prato, da língua e da cultura, que os portugueses acertaram a mão ao vir saquear nosso tropical país, esta coisa se chama PUDIM.
Que fiquem com o pau-brasil, mas deixem esse doce. Pudim vale mais que espelhos, os índios sabiam disso.
Pudim > Ouro
E o Seu Luis é o confeiteiro do restaurante Ita desde a década de 70. Acho que ele tem um pouco de experiência em fazer pudins. Fica a dica.
Além disso, um restaurante que tem 72 latas de leite condensado expostas no balcão só pode ser um lugar cheio de muito amor. Eu contei, pessoal. 72.
Único porém é que até nesse paraíso português no centro de São Paulo, o maldito do último pedaço de pudim é impossível de se pegar. Às vezes é para manter as tradições, como fazer as contas a lápis, rabiscando o balcão de mármore. Às vezes é apenas mais um trauma que eu tenho da minha infância, de sempre sobrar um pedaço de pudim nos domingos de Páscoa (e esse doce minha tia fazia muito bem!).
Serviço:
Restaurante Ita
Rua do Boticário, 31 – Centro (50 metros do Largo do Paissandu)
Telefone: (11) 3223-3845
Capacidade: 39 lugares
Funcionamento: Seg. a Sex: 10h às 20h – Sáb: 10h às 18h
Angelo Lameu, 29 anos.
Engenheiro de Produção
Um mineiro em São Paulo.